Mais uma obra prima que encontrei no sebo em Juiz de Fora. E esse me custou só 5 reais!!!! Isso mesmo, 5 reais!!!!! Mas esse não é só mais um disco muito foda que eu comprei.
Procuro esse disco por mais ou menos 20 anos na minha vida!
Essa obra já influenciou vários trabalhos que já fiz, tanto de vídeo como de música. Quem me apresentou à essa maravilha foi meu amigo Ricardo Corrêa de Juiz de Fora. Ele já era um fã de carteirinha!
Talvez a Ópera mais radical já escrita na nossa civilização. Sua magnitude é tão intensa quanto séria como expressão cultural. Na minha opinião é a obra máxima de Carl Orff.
Para ajudar-los à entender sua importância, seu roteiro e sua descomunal montagem, trancrevo aquí exatamente o texto de sua contra-capa. É longo, mas é lindíssimo, não deixe de ler!
1º Cena
Esta peça sobre o fim dos tempos é chamada "A Vigília". Começa com as lamentações das 9 sibilas. Usando cantos asiáticos e melodias expressivas baseadas em escalas gregas, elas descrevem os terrores do julgamento do mundo. A encenação de Saltzburgo dispensa cenário antiquado, evitando oáculos píticos e imagens históricas concretas. Foi escolhida uma árvore para pouso das corujas que reconhecem plenamente o fato de que o egoísmo é a fonte de todo o mal, e que a ânsia de possessão é a arma da guerra. Esta árvore é tão misteriosa quanto as profecias das Sibilas , tão romantica quanto sua linguagem simbólica e tão funéria quanto sua história. As três primeiras sibilas formam o tronco da árvore da vida. Sobre seua galhos pousam as irmãs de cabelos compridos que gemem seus lamentos pela humanidade, condenada sem esperança de redenção. A sorte dos últimos seres humanos será tão terrível que, frente a ela, a morte seria desejável.
2º Cena
A arvore se desintegra, as sibilas pairam próximo a terra e falam dos acontecimentos deste mundo quando não mais existirmos. Orff rejeita essa visão pessimista do fim das coisas. Recusa-se a acreditar em um Deus que nos ameaça com julgamento e punição eterna. Ele acredita que Deus não é um temível demônio mas um Deus de amor e consolação. Seu lema: "Omnium rerum finis erit victiorum abolitio" - o fim de todas as coisas será o esquecimento de toda culpa, palavras de Origen, um dos pais da igreja. Seu ensinamento revela o drama cósmico dos seres espirituais criados por Deus e por Ele dotados de razão. O drama começou no Céu antes do começo dos tempos, quando esses seres se rebelaram contra seu criador. Deus os puniu dando a cada qual haveres materiais em proporção da extensão de sua culpa individual. Origen considerou o assunto como a base do esfriamento do amor. Assim o mundo começou a existir como consequência do pecado. Enquanto punia pela imposição das coisas materiais, porém, Deus pretendeu também permitir um caminho para a redenção e o esclarecimento. Segundo Origen, o meio radical para a salvação é
2º e 3º Cenas
a destruição do mundo, de modo que todas as coisas possam reverter ao estado primordial. Todas as criaturas dotadas de razão de novo se tornarão iguais, misturando espírito e matéria. As sibilas flutuam agora como satélites sobre a nossa terra, que brilha como uma linda bola de luz sobre os astronautas sibilinos. Elas descrevem a noite que "abraçará igualmente pobres e ricos", e em que a vontade justa será salva e os sem Deus perecerão. "Todos os elementos básicos do universo desaperecerão: ar e terra e mar, e a luz do fogo incandescente; e a abóboda dos céus e a noite, os dias todos se fundirão em um, envolvidos na mais profunda escuridão. Tudo então se fundirá e novamente será separado através da purificação" Em grande gritos desaparececem deste mundo estas figuras do mal. que representam nossos temores mais básicos e são vozes de nossa insegurança existencial. Ibunt, ibunt, ibunt, impii in gehennam, FOGO ETERNO NOS ESPERA - ignis eterni!
4º Cena
Os anacoretas respondem com um veemente "Não" à ameaça do fogo eterno. Os acetas eremitas do deserto, eruditos dedicados à lamentação, chamam a ameaça de mentira e descepção, uma história infantil. Eles, os esclarecidos, rejeitam com sorrisos a religiosidade fundada na repressão, no medo e no terror. Foi-lhes dada uma formação claramente matemática: um grande telescópio, uma tela de radar que capta amor não adulterado. Esses calvos mestres , penitentes do deserto de início se exprimem na música de maneira puramente verbal. A única música dessa seção é a quinta vazia sobre o dó quando os anacoretas expressam sua esperança. "Unus solus deus ab aeterno in aeternum" Ouvimos essa quinta novamente um pouco depois, quando os meninos se juntam à música com seu otimista "Esaei" (Para sempre). Para os anacoretas é impossível que uma criatura possa ser eternamente condenada. eles não consideram nem mesmo Satã punido por toda a eternidade. O diabo ronda e desvia muitos, mas isso foi pretendido ou permitido por Deus Todo-Poderoso porque "Nihil contra deum, nisi deus ipse". Eles contradizem a afirmação das sibilas de que todo erro deve ser expiado no fogo do inferno depois dos tempos, no futuro. Enfatizam que a expiação ocorre "hic et nunc", em nosso tempo. Estes sábios ignoram, porém, o que virá no fim dos tempos.; eles também não tem resposta para o nosso objetivo, o nosso propósito último.
4º / 5º Cena
Eles, os lógicos, devem pedir um pedir um sonho que nos revele qual será o nosso fim. Esses gnósticos buscam um rico sono em sonhos, a fim de aprender como agnósticos como será o fim dos tempos. No acorde de cinco vozes de uma reiterada invocação do sonho divino dos hinos órficos, percebemos a impotência do que é puramente analítico e o poder da imaginação. "Deus nos manda profecia, Predição, Revelação de um sonho. Deus nos manda esse sonho" E o divino sonho alado envia-lhes o ansiado sonho.
6º Cena
O sonho dos anacoretas do fim dos tempos torna-se-nos visível: os últimos seres humanos saem dos buracos. A catástrofe no fim das idades ocorreu, o sol foi destruído. Contudo, Carl Orff não deu a esta última sessão de sua Comoedia o nome de Dies Irae, as palavras com que começa a sequência, mas Dies Illa, o dia em que os seres humanos são confrontados com o destino de que diariamente se aproxima em seus pensamentos. Como são os "últimos seres humanos"? Não são mais do que cabeças, orgãos reprodutores, nada além de automatos? Terá o produtor de criar um conceito de ficção científica? Na nossa apresentação eles vêm como formigas negras e perderam suas faces. Estão perdidos, abandonados, e todos os caminhos levam a nada. Estes últimos dos últimos rodam em círculos pelo globo vazio. "Foram enganados pela morte e estão profundamente perturbados por não terem sido preparados para o fim que os espera".
7º Cena
"Parati non sumus". A música se torna exasperada ante o grito das massas que perderam seus haveres e se lançam contra um céu vazio sobre uma terra vazia. O sonho dos anacoretas é muito semelhante ao pesadelo da humanidade e ao que as sibilas profetizaram. Os últimos seres humanos perdem o chão sob seus pés e não podem se sustentar: "Estamos caindo, caindo, caindo, caindo pra fora do tempo no fim dos tempos." O carrossel da terra gira erraticamente e lança seus passageiros, já que não podem nela se agarrar, ao negro vácuo. Nada sobreviveu, nada permanece, "nihil restat", além do momento imediato que, por isso, eles resolvem aproveitar ao máximo. Essas pessoas sem caras só podem expressar o que quer que seja com máscaras - uma mascara mostrando uma cara alegre, outra um grito de horror. Sem máscaras não são pessoas os últimos seres humanos.
8º Cena
Estes últimos seres chamam, imploram, pedem, gritam por piedade na noite gélida. Gemem um Kyrie para o céu, que já não responde. Aguardam ansiosamente uma resposta e esperam o julgamento do Poderoso. Querem que ele, com sua força, acabe com o terror que sentem, mas o céu se desintegrou e o homem está só. Já não pode haver díalogo, o homem não recebe palavra nem veredito, ou sentenca. A Criação estea silenciosa. Deus recusa-se a responder. O homem se aflige com o mais profundo horror: "Angor, timor, horror, ac pavor, invadit omnes". Mas Lucifer, que certa vez foi nos enviado por Deus para nos dar a luz, o portador de luz cujo reino se tornou o lugar da escuridão porque ele pretendeu ser Deus, este responde.
9º Cena
Surgem as chamas de Tártaro. As pessoas se aterrorizam, acreditando que as portas do inferno estão por se abrir. Alarmados, não pensam no propósito de purificação pelo fogo. Dissolverei tudo e separarei tudo para a purificação", haviam proclamado as sibilas como sendo a palavra de Deus. O chefe do coro tenta sublevar o povo com palavras dos Carmina Burana, mas ele também é vencido pelo terror quando vê o olho que nos vigia. Não é o olho trino da Divindade, mas
OCULUS ASPICIT UNOS TENEBRARIUS TENEBRIS
O OLHO NEGRO NOS CONTEMPLA COM A ESCURIDÃO.
10º Cena
O olho é despedaçado e o "atributo corporal" é projetado para frente como sob o impulso de uma catapulta. O inacreditável acontece: Lúcifer confessa três vezes "Pater peccavi". Em seguida à sua confição, os trompetes proclamam a quinta sobre o dó. Embora todos os outros seres não tenham face, Lúcifer, portanto os emblemas de bestas que conhecemos do Apocalipse, é a única criatura que não perdeu seu rosto. A instrução de Orff dada ao cenário é a seguinte: "Um raio de luz ilumina a máscara, que cái e revela uma face suave, o casaco e as garras caem, retira o capacete e o cabelo se espalha em ondas vermelhas. Ele é de novo o Lúcifer de antigamente." Os seres humanos jea não tem faces moldadas segundo a imagem de Deus, mas essa imagem foi preservada por Lúcifer. Ele começa o Restitutio que põe ordem de novo à existência. A voz da terra, vox mundana, proclama a partida para uma nova região. Venio ad Te, Tu paraclitus est sum finis e as vozes celestiais voces caelestes, proclamam a nova união do espírito e da matéria.
11º Cena
A destruição, a dissolução do mundo é o meio radical de salvação, para para que possibilite um retorno ao estado primordial. Essa condição é puro espírito. Mas como deve ser representado o puro espírito? Orff sugere luz sempre crescente, mas mesmo as mais poderosas fontes de poder não seriam capazes de produzir efeito suficientemente radiante. Nós de novo mostramos o homem em sua sectio aurea, mostramos como ele é transformado numa figura matemática, e como isso por sua vez se dissolve na luz. Luz que concentricamente enche o disco elevado do palco. Uma nova manhã encerra a vigília e tudo recomeça. Na seção conclusiva da música as violas tocam notam de igual valor, indicando que o estado primordial foi restaurado. Orff quis que Deus fosse visto não como um vingador mesquinho, fosse visto como um Deus que não percegue o culpado além dos nossos tempos mas nos permite livrar-nos dos erros em nossos próprios dias.
Essa ópera utiliza uma incrível não usual combinação de instrumentos: • 6 flautas; • 3 clarinetes em Eb • 3 clarinetes em Bb • 1 clarone • 6 trompas em F • 8 trumpets em C • 6 trombones • 3 harpas • 3 pianos com dois pianistas cada • 1 orgão eletrônico • 1 tuba • 4 violas da gamba • 8 contrabaixos • uma enorme seção de percussão (100 instrumentos ao todo para uma média de 25 à 30 músicos) que inclui: • 2 caixas • 6 pandeiros • 3 tambores tenores • 2 tambores baixo • 3 darabukkas (alto, tenor e baixo) • 3 tom-toms • 6 congas • 1 conga baixo • 4 "timpanettis" sem recurso de afinação; • 5 timpanos (3 com pratos) • 5 crotales • 5 pratos suspensos • 1 par de pratos crash • 3 copper tam-tams (40-60 centímetros de diâmetros) • 2 tam-tams grandes • 1 gongo afinado no baixo em C • 1 dobaci (tipo de sino japonês) afinado em C sustenido • 5 sinos de bronze afinados com intervalos de semitom • 2 set de sinos tubulares • 1 triangulo • 1 reco-reco • 1 whip • 1 par de maracas • 6 castanholas • 1 hyoshigi • 1 angklung • 3 wood bells • 5 wood blocks • 2 matracas (uma simples e outra dupla) • 3 matracas de igreja grandes • 4 copos com água • 2 glockenspiels • 1 lithophone • 1 metalophone • 3 xylophones • 2 marimbas
Gravações em fíta magnética podem ser ouvidas em 4 momentos distintos da ópera, em especial no momento da aparição de Lúcifer. Esses momentos são reforçados ao vivo por: - orgão - marimba - crotales - timpanos - solos de tenor e contralto - um grande coro emitindo um grito bem alto composto pela seção de tenores, duplo coro de sopranos e altos e um coro de crianças soprano.
Gravações em fíta magnética podem ser ouvidas em 4 momentos distintos da ópera, em especial no momento da aparição de Lúcifer. Esses momentos são reforçados ao vivo por: - um orgão de igreja - marimba - crotales - timpanos - solos de tenor e contralto - um grande coro emitindo um grito bem alto composto pela seção de tenores, duplo coro de sopranos e altos e um coro de crianças soprano.
Acima a versão sem graça do lançamento em cd.
CARL ORFF (1895 - 1982)
DE TEMPORUM FINE COMOEDIA ® 1974 Polydor International GmbH, Hamburg
Tracklist: 1 - 5 - I. AS SIBILAS 6 - 11 - II.OS ANACORETAS 12 - 18 - III. "DIES ILLA" - OS ÚLTIMOS HOMENS
Orquestra Sinfônica da Rádio de Colônia Regente Herbert Von Karajan
A única referência que encontrei à essa obra no youtube é falando sobre uma montagem moderna na Rússia. Vale à pena conferir. Pena que quase não se ouve a música:
Nenhum comentário:
Postar um comentário